quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Casal de motociclistas viaja para a cidade mais austral da terra

 

Casal de motociclistas viaja para a cidade mais austral da Terra, cada qual pilotando sua moto!

Matéria publicada em 28/12/2010
Texto introdutório e entrevista por Policarpo Jr

Ushuaia é considerada a cidade mais "austral" da Terra. Isso significa que tal cidade fica no ponto habitado mais ao sul do planeta. Basta ver um mapa mundi e compreenderá melhor...

Viajar de moto para Ushuaia já virou uma tradição e marco. É certamente um dos destinos mais cobiçados e comentados por motociclistas de viagem das Américas e até mesmo de outros continentes. Aqui no RockRiders.com.br já fizemos várias matérias a respeito de viagens de moto para Ushuaia.

Acreditamos que nunca é demais fazer matérias sobre Ushuaia, isto porque, embora bastante explorada, o fato é que cada viagem é uma viagem, mesmo que para o mesmo destino, sempre temos pontos de vistas, detalhes e características diferentes. Tem um frase que gosto muito: "Só quem faz a viagem sabe o que ela significa".

O casal André e Chris (foto abaixo), residentes em São José do Rio Preto/SP (distante 520km da capital), realizaram entre novembro e dezembro/2010, uma linda viagem para Ushuaia, com o diferencial, de cada um ter ido pilotando sua moto, André com sua V-Strom 650 e Chris com sua Falcon 400.


André Carrazzone e Chris em El Chalten

Poucas são as mulheres motociclistas que vão pilotando até Ushuaia. Não é uma viagem simples, devido ao conhecido "vento patagônico" e por ter mais de 2000km de paisagens repetitivas do "deserto patagônico". Mas, chegar de moto em Ushuaia e explorar as belezas naturais em seu redor, é algo muito marcante para a vida de qualquer motociclista de viagem.

RockRiders.com.br homenageia o casal com essa entrevista, feita com a Chris, com participação do seu namorado André Carrazzone.

1) Como foi o planejamento da viagem de vocês? Onde buscaram informações? Quais os acessórios e apetrechos que foram utilizados?

O André fez o planejamento das rotas no computador, listamos as concessionárias Honda e Suzuki e também dos albergues (Hosteling International) do caminho. Em duas ocasiões definimos o que seria levado e fizemos uma listagem, além da nossa documentação e das motos. Fez parte do planejamento também, a troca da minha moto, que era muito problemática e a posterior preparação da Falcon.

Houve também uma preparação física e psicológica, fizemos algumas viagens durante o ano, para aprimorar a técnica. Além disso, foi feito um planejamento nas empresas que gerenciamos, para que nada parasse na nossa ausência. 

- A documentação: sites oficiais de consulados, ministério das relações exteriores;
- Rotas e trajetos: sites oficiais de Dpto de Transito dos países que passamos;
- Postos de gasolina: site da YPF;
- Livros e relatos de viajantes mais experientes e muita pesquisa na internet.

Na minha moto (Falcon 400): parabrisa, protetor de mão, manopla aquecida, protetor de motor com pedaleira, baú de 45l, mala de garupa, adesivos cor de rosa, claro!

Equipamentos que usei:  roupas térmicas da 100% Go Ahead (www.go100.com.br), uma nova jaqueta impermeável, uma nova luva para pilotagem no frio, bermudas para longa distância, além de luva segunda pele e meia quente.

Equipamento para os dois (foram na moto do André): Kit de reparo para pneu, lâmpadas e fusíveis para as duas motos, todos os cabos, filtro de ar, óleo para reposição e de corrente, ferramentas para todas as necessidades e comidinhas desidratadas.

Nosso Planejamento das rotas é praticamente todo feito no programa da Garmin para GPS, o Map Source, usando os mapas do projeto Tracksource, Mapear, ConoSur, entre outros. Usamos também alguns sites Argentinos e Chilenos, como http://www.vialidad.gov.ar/ http://www.cancilleria.gov.ar/ http://www.mapas.mop.cl/ http://www.vialidad.gov.cl/ e o Ruta0, que pra mim é o melhor deles http://www.ruta0.com/

Os Kits de aquecimento de manoplas são Symtec (http://www.symtec-inc.com/) , recomendo! Simples de instalar e funcionam muito bem.

Sempre fazemos o planejamento diário contemplando uma cidade com alguma estrutura para o pernoite. O Hotel que vamos ficar é escolhido antes da chegada, na busca do próprio GPS. Escolho uns 4 para ver, entro em algum deles e escolho o melhor e mais em conta.

Em termos de distância, nosso ritmo é de 600km/dia em média, salvo os casos onde existem pontos turísticos ou algo interessante para visitar. Em todos os dias optamos por sair bem cedo para que a chegada seja com luz do dia, além de em locais turísticos, podermos aproveitar os pontos ainda no dia da chegada.

As peças sobressalentes e kits de socorro das motos e dos pilotos são planejados de acordo com as possibilidades de quebra e problemas de saúde. No kit de peças levo compressor de ar, camaras, reparo de pneus, todos os cabos de aço, lâmpadas e fusíveis, além de no caso da V-Strom DL, levar componentes para diagnóstico da injeção e, no da Falcon, um retificador de voltagem. parece um absurdo, mas como vamos sempre solo, estou pronto para qualquer problema.

No kit de remédios temos primeiros socorros, remédios para enjoo, cólicas, dores, além de alguns mais potentes para o caso de algum acidente ou dor mais séria.

Ah, levamos também um GPS de back-up, hehehe, exagero, mas vai que precisa né!?

2) Qual a experiência em viagens da Chris antes de partir para essa até Ushuaia?

Já fizemos algumas outras viagens: litoral de SP, RJ e SC, Chapada Diamantina-BA, Belo Horizonte-MG, Serra da Canastra-MG, Canyon Guartelá-PR, Bonito-MS, Campo Grande-MS, Nova Petrópolis-RS, Serra do Rio do Rastro-SC, Estrada da Graciosa-PR entre outras menores.

3) Não é comum, motociclistas mulheres irem pilotando até Ushuaia. No caso da Chris foi com uma Honda Falcon 400cc. O que a motivou para realizar uma viagem desse porte, pilotando sua própria moto. ao invéz de simplesmente ir na garupa da V-Strom do namorado?

Sempre gostei de aventura e esportes de ação. Conheci o André participando de Rallye de Regularidade, onde eu navegava pro meu pai. Começamos a namorar e no primeiro dia dos namorados ganhei um capacete de presente e foi ai que minha história com moto começou.

Tirei carta de moto e comprei a primeira com ajuda do André. Sem ele provavelmente hoje eu não estaria andando de moto e com certeza não teria feito essa viagem incrível.

Quem já pilotou uma moto, sabe que ser garupa não é tão divertido e emocionante quanto pilotar.

4) Com o conhecido "Vento Patagônico", como foi o comportamento das motos utilizadas na viagem (V-Strom 650 e Falcon 400)? E dos pilotos? Muito se ouve falar sobre o vento na região patagônica, como foi o "enfrentamento" do casal em tais situações?

Eu sabia que o vento iria ser forte e constante durante boa parte da viagem (de Bahia Blanca pra baixo), mas não esperava que fosse tão forte. As motos andavam inclinadas o tempo todo, exigindo muita concentração dos pilotos. Ficamos sabendo depois que passamos por uma tormenta.

 

Eu tive certa vantagem com relação ao André, por dois motivos: primeiro que a moto dele estava mais pesada, por conta das ferramentas e apetrechos que levamos, o que exigia mais força dele para se manter no curso, e segundo, que ele sempre estava na minha frente e ficou mais fácil pra eu saber o que me aguardava ao passar pelos guard-rails ou pelas curvas da estrada.

O que acontece é que no guard-rail, o vento era desviado e a moto voltava a ficar reta. Então eu estava sempre vendo o que acontecia com o André e já me preparava. Além disso, pelo comunicador ele também me ajudava com as técnicas de pilotagem, o que facilitou muito a minha viagem.

O vento é uma das atrações do lugar! Tivemos que ter muita concentração e atenção redobrada. Deve-se percorrer todo o trajeto “negociando” cada ultrapassagem, antecipando cada montanha, cada guard-rails, enfim, acredito que nesse quesito, vento, o stress psicológico é maior que o perigo.

Passamos por situações muito difíceis. Quando se ultrapassa com o vento vindo do lado direito, enquanto se está ao lado do outro veículo o vento desaparece e reaparece em forma de rajada logo após a frente do tal.

5) Durante uma longa viagem como essa que fizeram é comum encontrarmos vários motociclistas no percurso. Qual a reação desses motociclistas ao conhecerem a Chris, uma mulher pilotando uma Falcon até Ushuaia!?

A primeira reação sempre foi de espanto e logo depois de curiosidade, em saber de onde estávamos vindo e há quanto tempo estávamos na estrada.

A Chris anda com Roupa Térmica, produzida especialmente para ela, na cor rosa. Em vários postos de combustível que entramos, o frentista a chamava de Senhor, talvez achando que ali estavam um casal de gays Brasileiros, mas assim que ela tirava o capacete e a balaclava começavam as perguntas e o espanto.


André Carrozzone (no meio) e dois motociclistas que encontrou na viagem.

Vários motociclistas que encontramos pelo caminho, como ela disse, se interessavam pela moto, pela quilometragem que ela andava por dia, mas, sei que todos eles morriam de inveja da minha situação! Passear com a namorada, em duas motos....não tem preço! Além do fato de ela ser uma super companhia, ter muito jogo de cintura, ser calma, enfim, é uma benção que me deram de brinde nessa vida!

6) Quais foram os pontos "altos" da viagem, isto é, os locais que conheceram que mais chamaram atenção pela beleza, ineditismo de situações e deslumbramentos?

Glaciar Perito Moreno, Fitz Roy e Península Valdez.

O Perito Moreno impressionou demais pela enormidade! Dá a dimensão certa do que realmente somos nessa vida. É um aviso da Natureza, como dizendo: Olha só o que eu sou!

 

O Fitz Roy também é demais pelo tamanho. Para se ter uma ideia, assim que saímos de Calafate avistei ele, sem saber que era o próprio. Poxa, são 150 km ou mais, não era possível que já o avistava, mas desacreditei quando percebi que era o próprio. Foi nos seguindo a viagem toda até Chalten. Outra “ignorância” da natureza!

A Península Valdez, assim como Punta Tombo e outro locais de apresentação da vida marinha, no caso da Chris que é formada em biologia, é uma curtição sem igual. Lógico que andar entre pinguins ou ver elefantes marinhos é impressionante, mas entender o que se passa e do que se trata é bem mais emocionante. Foi mesmo muito legal!

7) Vocês rodaram em vários trechos com rípio não é mesmo? Conte-nos um pouco sobre essa experiência.

Já tive experiência em estradas de terra na Serra da Canastra e Chapada Diamantina e o rípio que pegamos na Terra do Fogo é uma rodovia muito utilizada por caminhões, então o piso era mais firme. Já o rípio de Punta Tombo, dentro de uma área de reserva, era bem mais fofo e mais técnico pra pilotar. E novamente contei com instruções ao vivo (corpo pra frente, toque no freio para direcionar a moto e prender a moto com os joelhos).

O Rípio é o nosso cascalho com nome diferente. Técnicas de pilotagem na terra ajudam e muito, mas se não as tiver, paciência e bom senso servem muito bem. Os carros andam nessas estradas com velocidade e acredito que o maior perigo está ai, por que as pedras são lançadas com violência pelos pneus para todos os lados, na verdade esse era nosso maior medo!

Nessas estradas é interessante ver como o departamento de trânsito age: existiam placas dizendo: “No caso de acidente auxilie as vitimas!” Imagine? Quer dizer, se vira por que vamos demorar, hehehe! E olha, isso acontece mesmo: minha moto teve um pequeno problema no interruptor do descanso e enquanto eu arrumava, logo em seguida ao acontecido, parou um caminhão para ver se precisávamos de algo. Foi muito legal e reconfortante!

8) André, como proprietário da empresa 100% Go Ahead, você testou vários produtos, e ai, como foram os resultados? O que os motociclistas podem esperar dos produtos fabricados pela sua empresa?

Nosso objetivo é encontrar tecidos cada vez mais tecnológicos e compactos para o uso no motociclismo. Tive a oportunidade de testar novas tecnologias de tecidos, além de levar vários novos modelos de roupas para o teste.

Levo em minha moto alguns equipamentos como termômetros, higrômetros e etc, tudo para me dar dados concretos sobre as peças que testo. O resultado será o lançamento de novos tipos de Segunda Pele, mais compactos para a bagagem, além de novos produtos como a luva que realmente é térmica e não atrapalha a pilotagem, um colete da nossa linha Extreme (menor volume e pode ser usado com uma blusa Ultra), novas modelagens de blusas e balaclavas entre outros.

Mas o que mais me impressionou de tudo que levei, sem dúvidas foram as bermudas Long Distance. Fiz alguns testes antes de lança-las mas não um desse porte. Levei 2 peças idênticas à que lançamos. Usei uma na ida e outra na volta e posso tecer alguns comentários: o fato de o tecido ser bacteriostático é um diferencial absurdo. Ela não fica com cheiro após o uso (mesmo de vários dias), não dá nenhum tipo de coceira e, no que diz respeito ao atrito com a pele, não cria nenhum problema do tipo pelo encravado, fuliculite ou outros. A compressão do tecido é perfeita e em momento algum da viagem, dos 13milkm, precisei passar algum tipo de pomada ou produto na pele por sentir dores ou algum problema desses comuns aos motociclistas. Sei que sou suspeito para falar dos produtos, mas de toda a nossa linha, se posso citar um produto milagroso, este é a bermuda Long Distance.

9) André, você que tem uma boa experiência em viagens a vários destinos do Cone Sul, qual o paralelo que você traça, entre uma motoviagem ao Deserto de Atacama e essa última que realizou para Ushuaia?

Acho que o mais interessante, pelo menos na minha opinião, é perceber que o destino Ushuaia é um marco das moto viagens. Trata-se de um troféu, de um local em que se diz “Eu fui a Ushuaia de Moto” para marcar território e talvez dizer que você tem algum mérito por isso.

Tínhamos interesse no local por causa das histórias dos livros de outros viajantes, como Amir Klink por exemplo. Digo isso pelo comparativo entre ir até lá ou ir ao Atacama ou Machu Picchu ou outro destino desses.

Lógico que pontos como a cidade de Ushuaia, Glaciar Perito Moreno entre outros são muito legais, mas a estrada até lá é de uma vastidão desoladora. O caminho, pelo menos pela Ruta 3 é pasto, estepes, vegetação rala, poucos animais, diferente por exemplo de ir ao Aconcágua ou Atacama, onde passamos por regiões montanhosas, vemos Vulcões nos acompanhar nas estradas, muitos animais diferentes, enfim, não sei dizer se foi uma impressão ou se foi preocupação pela responsabilidade em ir com a Chris em viagem solo que me fez ver assim, mas em termos de beleza, não comparo essa viagem à um passeio ao Atacama, estradas da Bolívia ou Aconcágua!
Será que fui claro?

10) O que cada um de vocês, de forma resumida, diria para um motociclista que está se preparando para empreender uma viagem até Ushuaia? 

Antes da viagem, muito planejamento, preparação física e principalmente psicológica e durante a viagem, bom senso, determinação, concentração e foco nos objetivos diários.

É sempre bom ter um terço, santinho ou uma imagem sacra (brincadeirinha). Não tenha receio! Não acredite nos folclores sobre o vento, falta de combustíveis ou apoio mecânico, temperatura entre outros. Cada viagem é uma viagem diferente. O que aconteceu conosco é um caso e o que acontecerá com outra pessoa, será outro completamente diferente. Somos pessoas diferentes e sentimos dificuldades diferentes.

Quando estávamos para ir ouvimos de tudo, como por exemplo, que o vento em certa localidade passava de sei lá quantos km/h, que tal lugar era terrível e que nevava em outro. Não tivemos nenhum problema com relação à força do vento. Soube depois que passamos por uma tormenta de ventos acima dos 120 km/h, mas uma pessoa havia me dito que tinha andado 100km em primeira marcha, outro me falou que havia passado por vento de 200 km/h, hehehe. É aquele caso de enaltecer a viagem, de a minha viagem ter sido a MAIS, mais difícil, impossível de fazer, eu sou o bom, e outros problemas psicológicos e síndromes de inferioridade.

Quando contar sobre a viagem para certas pessoas, deve dizer que a sua foi tranquila, que teve sorte, que a dele foi bem mais difícil, daí não perde o amigo, hehehe! Enfim, não acredite em folclore. Um dia de cada vez, uma dificuldade por vez. Sofra na hora, não antes! E acredite na sua capacidade.

 

Envie uma mensagem para a Chris e o André através do Livro de Visitas do Rock Riders ou via e-mail andrecneto@terra.com.br

Leia mais relatos e dezenas de fotos no 
Blog do Casal: 
http://acnmoto.blogspot.com/

 

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Trilhados M.C

Marcellus Luiz

Vice presidente

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